A OPÇÃO

Manuel António Pina (MAP) escreve todos os dias no Jornal de Notícias. As suas crónicas são, regra geral, de qualidade. De vez em quando, no entanto, não sei se por ignorância se por qualquer outro motivo, alinha na desinformação organizada que hoje domina o universo mediático. E quando assim é... é uma desgraça.

Na sua crónica de hoje, MAP atira-se a Hugo Chávez utilizando os «argumentos» em voga nos média dominante quando se trata da Venezuela: a mentira - mentira tantas vezes repetida quantas as necessárias para ser tomada como verdade e utilizada até por um cronista da craveira de MAP...

MAP, que até simpatizou com Chávez quando este, «em 1992, se levantou contra a plutocracia de Andrés Perez», está agora preocupado com o Chávez actual e com a evolução da situaçao na Venezuela.
E que preocupações são as de MAP?
Ele explica: «crescentemente a "revolução bolivariana" parece assumir, com a progressiva redução das liberdades (a última, depois da liberdade de informação, é a liberdade de manifestação) aspectos do "socialismo real".

Impressiona como, em tão poucas palavras, MAP consegue sintetizar o essencial da campanha em curso contra a Revolução Bolivariana (sem aspas e com maiúsculas) organizada a partir dos EUA e propagada por todo o planeta pelos média dominantes.
E a verdade é que, se MAP se desse ao trabalho de fazer o trabalho de casa que lhe compete, ficaria a saber que na Venezuela a liberdade de informação é uma realidade observável e de fácil constatação.
Fcaria a saber que, na Venezuela, os média propriedade do grande capital desenvolvem todos os dias uma intensa actividade em que o vale-tudo é lei e colaboraram, até - e activamente - na preparação do golpe militar que há sete anos tentou derrubar o governo legítimo (recorde-se o caso da revista Boémia, que até já tinha uma edição a anunciar o êxito do golpe, com «reportagens» recheadas de pormenores...)
Ficaria a saber, igualmente, que a grande diferença em matéria de liberdade de informação, entre a Venezuela e Portugal, é que lá existe uma outra informação, alternativa à informação do grande capital, uma informação revolucionária.
E ficaria a saber que o mesmio se passa com a liberdade de manifestação e com todas as liberdades (políticas, económicas, sociais, culturais) que fazem uma democracia - e sem as quais o que existe é uma imitação de democracia.
Como MAP pode constatar olhando para a realidade portuguesa.

É fácil, muito fácil, alinhar na operação imperialista contra a Venezuela Bolivariana.
É difícil, muito difícil - e arriscado - combater essa operação.
Todavia, nesta como em muitas outras situações, «a barricada só tem dois lados: o nosso e o deles».
E não há outra opção.

POEMA

(Pequenos enredos para as pessoas,
sem imaginação nem ouvidos para gozos tímbricos,
ouvirem Schonberg e os seus descendentes.)


1

Naquela roseira do jardim geométrico
nasceu uma rosa de metal
a cheirar a gumes...

E ali ficou
à espera que um príncipe,
hirto de amor,
a arrebate
com delicadeza de dedos de alicate.

2

(Esta música também já tem os seus lugares-comuns.)

Mistério evidente com tantãs
e o breve sopro
que deixa na cara
o lençol da agonia...

Mas eu prefiro o outro,
o mistério difícil
em que ninguém repara
das rosas cansadas do dia a dia.


José Gomes Ferreira

SEM CAROÇOS...

O Público de hoje dá notícia do comício organizado pela Juventude Socialista, em Santa Cruz, Torres Vedras.
Pelo relato dos acontecimentos, Carolina Patrocínio foi a grande revelação da noite: de entre os vários oradores só ela disse coisas que até então ninguém lhe ouvira dizer - ao contrário de Sócrates, que repetiu tudo o que anda por aí a dizer e do Presidente da Câmara de Torres Vedras e do secretário-geral da JS que repetiram tudo o que Sócrates anda por aí a dizer.

De Carolina Patrocínio, enquanto mandatária do PS para a juventude, até agora apenas conhecíamos a sua aversão a cerejas com caroços e a sua predisposição ganhadora, traduzida na frase: «prefiro fazer batota a perder».
Ora, em Santa Cruz ela revelou-se uma profunda conhecedora da realidade nacional actual, de tal forma que, ouvindo-a, dir-se-ia que alguém se encarregou de lhe limpar o discurso de caroços...

«Na condição de cidadã atenta e preocupada com o seu país» - e se ela o diz quem se atreve a negá-lo?... - Carolina Patrocínio pegou num papel e leu assim: «Portugal foi objectivamente dos primeiros países a sair da recessão técnica e isto assinala o início da retoma económica». Se ela o leu...
Continuando a ler - e sempre cheia de pensamento positivo - elogiou Sócrates pela sua «determinação» e pelos seus «êxitos», designadamente na «redução do insucesso escolar»...
Finalmente, num tom e num jeito cheios de fervor guerreiro, proclamou: «Combateremos ao lado de José Sócrates os cépticos e os bota-abaixo».
Enfim, um discurso sem... caroços...

Após o comício, a jornalista tentou colocar algumas questões à eloquente oradora, mas ela - «aconselhada a não dar entrevistas», segundo o Público - limitou-se a dizer que «quer vencer».
Perder é que nunca.
Nem que seja necessário «fazer batota»...

POEMA

(Lápide.)


Mozart morreu. E no meio da tempestade
de neve e abandono,
dois gatos-pingados
de rendas de luto
e vénias de minuete
lançaram o caixão
na vala comum,
a assobiar.

Todo o planeta
passou a ser a cova viva de Mozart.


José Gomes Ferreira

PALAVRAS JUSTAS

O Presidente da Assembleia Geral da ONU, Miguel D'Escoto, entregou hoje a medalha de «Herói Mundial da Mãe Terra» àquele que considera ser «o maior expoente e paradigma de amor á Mãe Terra»: o Presidente da Bolívia, Evo Morales.

Recorde-se que Evo Morales foi eleito em Dezembro de 2005, tendo tomado posse em Janeiro de 2006.
De então para cá, muita coisa mudou naquele país, designadamente:
os recursos naturais da Bolívia passaram a ser propriedade da nação;
foram modificados todos os contratos com as empresas petrolíferas estrangeiras;
milhões de hectares de terras foram entregues a camponeses e a indígenas;
foi criado um serviço de saúde para os pobres;
foi atribuída aos idosos uma pensão mínima;
acabou-se com o analfabetismo;
melhoraram sensívelmente as condições de vida do povo -
- além de a Bolívia ter passado a ser um país soberano, livre do domínio do imperialismo norte-americano.

Por caminhos semelhantes optaram, na última década, vários países da região: a Venezuela, o Equador, a Nicarágua, as Honduras, o Paraguai... - caminhos naturalmente com as suas diferenças, mas convergindo todos no esforço de melhorar as condições de vida dos seus povos, na postura de defesa das suas soberania e independência, e numa inequívoca afirmação anti-imperialista.
Razões mais do que suficientes para que o império afiasse as garras e passasse ao ataque - como está a acontecer.

Também sobre isso se pronunciou Miguel D'Escoto, ao afirmar que «a América Latina deve ser declarada território livre de bases militares estrangeiras».
Disse ainda que a "mudança" prometida por Barack Obama, tem-se traduzido até agora em «acções que não abonam nem a segurança nem a paz», como o comprova a intenção do Governo dos EUA de «converter a Colômbia no Israel da América Latina».

Palavras justas, estas de Miguel D'Escoto, a confirmar que muita coisa está a mudar - não obstante os perigos e as ameaças que o imperialismo norte-americano continua a fazer pesar sobre os povos do mundo.

Registe-se ainda o facto, por demais significativo - e também anunciado pelo Presidente da Assembleia Geral da ONU - de Fidel Castro ter sido considerado «Herói Mundial da Solidariedade».

POEMA

(Stockausen. Música electrónica. Viagem espacial.)


Em cada homem
há uma viagem para um planeta longínquo...

(Para os pobres é a Terra.)


José Gomes Ferreira

«AVANÇOS SOCIAIS»...

O primeiro-ministro José Sócrates, em campanha eleitoral, não pára de propagandear as benesses da sua governação - benesses que só ele conhece e que a imensa maioria dos portugueses desconhece absolutamente.
Nos últimos dias, Sócrates bateu exaustivamente a estafada tecla dos «avanços sociais», de tal forma que, ouvindo-o, dir-se-ia que estamos à beirinha de entrar no reino da justiça social e da abastança - melhor do que o célebre «oásis» inventado por Cavaco Silva ou o não menos célebre «paraíso» saído da imaginação de António Guterres...


Entretanto, dados recentemente divulgados pelo INE dizem que 40% dos trabalhadores portugueses - ou seja: mais de 1 milhão e meio de mulheres e homens - ganham abaixo de 600 euros mensais - e, isto digo eu, na imensa maioria dos casos, ganham muito abaixo dessa verba...

Segundo esses mesmos dados, há um ano os trabalhadores nessa situação eram mais 157 mil do que são hoje.
Assim, à primeira vista, estamos perante uma evolução positiva...
Mas só à primeira vista, já que esses 157 mil hoje estão desempregados - e, na maior parte dos casos, nem subsídio de desemprego recebem, com o acontece a cerca de metade dos mais de 600 mil desempregados existentes.

Se a isto acrescentarmos os salários em atraso, as pensões e reformas de miséria, a saúde e a educação cada vez mais caras, o aumento silencioso mas constante do custo de vida, etc, etc, ficamos com uma noção aproximada dos «avanços sociais» de que fala Sócrates e de que falaram todos os seus antecessores dos governos PS e PSD ao longo dos últimos longos 33 anos...

POEMA

(Chopin mal tocado por um pianista de
olhos esvaídos no tecto... Muitos suspiros
das meninas sentadas no lado esquerdo
da plateia para verem bem as mãos do
pianista-assassino, donde pinga o sangue
do cadáver da «Balada nº 4 em fá menor»)


A menina chorou, chorou, chorou, chorou
até encher o copo de lágrimas
que depois bebeu
no destrambelho
de se envenenar com os próprios olhos
- ao espelho.


José Gomes Ferreira

REGISTO POSITIVO

De vez em quando - muito de vez em quando... - surge-nos, num qualquer representante dos média dominantes, uma notícia, uma informação, um texto de opinião, desenquadrados do critério de pensamento único em vigor.
Quando isso acontece... festeja-se o acontecimento, registando-o como positivo.

É o caso de um texto publicado na última edição do Expresso, intitulado «Tensão na América do Sul - Os Estados Unidos entram no coração da América do Sul gerando um clima de guerra fria», e assinado por «Márcio Resende, correspondente em Buenos Aires».

O texto em questão debruça-se sobre a situação decorrente dos acordos Obama/Uribe com vista à utilização de sete bases militares colombianas pelos EUA, e sobre as reacções de protesto contra esses acordos por parte dos líderes governamentais daquela região - reacções que os propagandistas do império identificam com «paranóia»...

Sobre o assunto, Márcio Resende foi ouvir a opinião de «Juan Gabriel Takatlian, Professor de Relações Internacionais da Universidade argentina Di Tela», que começou por dizer:

«Não há nem paranoia nem ignorância nos países da região. A preocupação é genuína. Tudo é possível, a componente militar não mudou na política dos Estados Unidos que voltam a estar presentes na região, desta vez no coração da América do Sul».

E sobre o texto do acordo, alertou:

«O governo colombiano promete que (a utilização das bases) será para a luta contra o narcotráfico e contra o terrorismo, mas o texto do documento refere-se a uso para operações contingentes, logísticas e de treinamento. Isso é muito mais do que a luta contra o narcotráfico».

E alertou:

«Estamos diante de um cenário opaco e confuso que leva a que tudo seja possível. Uma tensão na fronteira pode dar início a algum tipo de conflito que se sabe como começa, mas não como termina».


As declarações de Juan Gabriel Takatlian confirmam a intensificação e o agravamento da ofensiva do imperialismo norte-americano na Améria Latina, tendo como alvos os países que nos últimos anos se têm libertado do domínio dos EUA.
Acrescente-se que é neste quadro que deve ser visto o golpe militar das Honduras - que contou com a inequívoca intervenção do Governo de Obama, tanto na sua preparação como em todo o processo em curso visando a manutenção no poder dos golpistas.

POEMA

(«Requiem» de Verdi.)


Verdi
- Garibaldi dos mortos...

... que não deixaram apodrecer as bocas
nem transformá-las em flores,
para poderem cantar o entusiasmo da morte
num coro de vermes
que roem os pulmões dos tenores.



(Muito tempo passado, em Setembro de 1975,
em Leninegrado, ouvi este «Requiem»
tocado e cantado por uma orquestra da Arménia
numa noite que me encheu de glória.)


José Gomes Ferreira

A LIÇÃO

Uns tempos após o 25 de Abril, Mário Soares deu uma entrevista, na sua casa de Nafarros.
A palavra do entrevistado era complementada com fotografias da casa, dos campos em volta, de pormenores da sala, da biblioteca - uma biblioteca composta por, informava o entrevistado, 11 mil livros.
Perante tão volumoso número de livros, alguém comentou ironicamente: «as 11 mil virgens»...

Vem esta relembrança a propósito do artigo de Mário Soares sobre Marx, publicado no último número da Visão.
O texto é... Soares a falar, à sua maneira trapalhona, cheio daquelas aldrabices rascas com as quais fundamenta, quer o seu anticomunismo doentio, quer a sua condição de fervoroso defensor do capitalismo - ao qual usa chamar «socialismo democrático»...
No artigo, Soares exibe um profundo conhecimento de Marx e dá aos leitores da Visão... a lição que eles merecem: uma lição sobre a obra de Marx; sobre o pensamento de Marx; sobre a deturpação do pensamento de Marx levada a cabo por uns tantos totalitários; sobre o que é que Marx queria (ou não queria) dizer quando disse o que disse...

Finalmente, a encerrar a lição, confessa:
«Nunca consegui ler o Capital, de que, aliás, tenho duas edições, uma em português do Brasil e outra em francês» - ou seja: mais duas, a juntar às 11 mil virgens de Nafarros...

POEMA

(Primeiro intervalo no Teatro de S. Carlos.
Sorrimos uns para os outros.
«Então como está?» «Há muito que não o via!»...
Musgo. Teias de aranha nos ouvidos. Fascismo de smoking.
Passo pelos corredores escondido atrás de mim mesmo.)


Disseram-lhes
que estavam vivos
por disciplina de cemitério.

E todos acreditaram
já com os pés em ângulos rectos.

Mas vivos que são?
Mortos incompletos.


José Gomes Ferreira

TUDO SINCRONIZADO

O órgão central da Sonae oferece todas as semanas cerca de uma página do seu precioso espaço a Vital Moreira (VM). Oferece o espaço e, é claro, paga - bem pagas - as prosas do autor.
Não o faz, obviamente, por qualquer simpatia pessoal pela figura de VM: fá-lo, obviamente, porque sabe que VM utiliza aquele espaço na defesa dos interesses da Sonae, ou, dizendo o mesmo de outra forma: na defesa da política de direita praticada pelo PS.
Por iguais razões, igual espaço (e paga) é oferecido a outras figuras que ali defendem a mesma política de direita, mas praticada pelo PSD.

Os textos de VM primam, regra geral, por uma clamorosa cegueira sectária, por um primarismo pateta e têm como preocupação única aplaudir e propagandear tudo o que o Governo PS faz, sendo que, agora, com a aproximação das legislativas, o tema abordado é o apelo ao voto no PS.
Assim, hoje VM escreve - e o Público publica - um panfleto de propaganda eleitoral no qual, de mistura com imprecisões, falsidades históricas, leituras vesgas e outros disparates, proclama que, nas legislativas,
«há duas maneiras de levar a água ao moinho da direita. Uma, directa, é votar nos respectivos partidos. Outra, indirecta, é votar no PCP e no BE».

Confesso que me falta paciência, pachorra, etc., etc., para tratar tal prosa como ela merecia.
Em todo o caso, não quero deixar de trocar por miúdos o pensamento miúdo de VM, cujo é: quem não quiser levar a água ao moinho da direita só tem uma solução: votar no PS.

E também não quero deixar de dizer o que VM sabe mas não lhe convém dizer: quem votar no PS está, com esse voto, a levar a água ao moinho da política de direita - essa política que o PS (em nome da esquerda) e o PSD (em seu nome próprio) têm vindo a praticar há 33 anos consecutivos.
Para mal, muito mal, da imensa maioria dos portugueses.
E para bem, muito bem, da imensa minoria dos portugueses - minoria entre a qual se encontra o patrão da Sonae que, em paga, põe o seu órgão à disposição de VM...
Como se vê, isto está tudo sincronizado...

POEMA

(«Requiem de Mozart».)


Ímpeto de rasgar o tecto com as mãos
para gritarmos aos astros,
cá de baixo das labaredas do nosso poste:

«O mistério somos nós.

Fomos nós, os homens,
que criámos a morte.»


José Gomes Ferreira

A VERDADE...

A história é conhecida.
Mesmo assim, vale a pena voltar a ela, tanto mais que foi relembrada na recente entrevista de Jerónimo de Sousa ao Jornal de Negócios.
Uma criança, filha de um deputado do PS, tem uma admiração particular pelo secretário-geral do PCP - de tal modo que sempre que o vê na televisão, grita: «Jerónimo, Jerónimo, PCP!».
O pai da criança levou-a um dia ao Parlamento para que ela conhecesse pessoalmente «o Jerónimo».
A criança sentou-se ao colo dele, fez perguntas, respondeu a perguntas, brincou, brincaram - assim confirmando, na prática, as razões pelas quais gostava «do Jerónimo».
Depois, o pai levou-a a conhecer Francisco Louçã, frente ao qual a criança emudeceu: nem uma palavra, nem um sorriso...
«Então, por que é que não gostas do Louçã?» - perguntou-lhe o pai.
E ela: «Porque ele é muito alto»...

Ora, Jerónimo e Louçã são sensivelmente da mesma altura... pelo que outras serão as razões da empatia por um e da antipatia por outro manifestadas pela criança...
Ela lá sabe... e é bem possível que aquela tenha sido a forma que encontrou de dizer das suas razões...
E, como é sabido, «a verdade sai espontaneamente da boca das crianças»...

POEMA

(Falla.)


Um anjo cigano
inventou um instrumento novo
- viola de sol e nevoeiro
com cordas de nervos de touro.

Para o tocar
é preciso ouvir missa primeiro.


José Gomes Ferreira

Que VIVA CUBA!


hoje o alentejo foi ainda mais bonito, ainda que ardente na canícula de dia fervente de agosto! cada quilómetro percorrido ameaçava um abraço de solidariedade que o meu coração de comunista há muito ansiava. mas expliquemos que alegria me estilhaçou o dia, em pensamentos bonitos e acrobatas, para que, quem sabe, ela se torne contagiante... isto que vos conto, isto que lerão, é o materializar da musicalissima - será bach? - com que hoje - faz minutos - cheguei a casa. estas são as letras do meu coração:

sete da manhã, e num pulo de anunciada alegria, saltei da cama e logo um banho rápido - para que alisasse a pele e os olhos da minha feliz insónia! aí estava o dia, o grande dia. em alegria pueril rumei a casa da joaquina, camarada que amo como mãe que me vai faltando neste sul, para que juntos, bebendo um café que nunca mais acabava, esperássemos a alice - a minha linda alice - que haveria de passar vinda de mil fontes. connosco, dois ou três sacos de guloseimas e mimos para alguém que nos aguardava - quem sabe se desde o principio dos tempos?! Dali, beja, hoje como desvio, ficava agora a uma distância inimaginável, mesmo para caminho ampla e vastas vezes percorrido. uma da tarde e finalmente santiago do cacém. minutos depois - terão sido horas na minha ânsia? - e uma porta aberta anunciando um abraço comunista e solidário. Rosell e Cecília, cubanos, recebiam-nos nos braços. rosel, primeiro tímido e logo festivo! cecilia transportando uma alegria mestiça que nunca esquecerei. dois dos quarenta e dois médicos que cuba, CUBA, CUBA, CUBA, enviou rumo à população abandonada do meu alentejo e algarve. e logo risos e lágrimas como se nos conhecessemos desde o principio dos tempos, unidos no sonho de um mundo justo, fraterno e solidário. Lá estavam eles, provando, em gestos e em palavras, aquilo que há muito sabia de CUBA e dos CUBANOS, mas que, como tomé, precisava de ouvir e ver, como que prova provada que são calúnias tudo o que o capitalismo faz da ilha e do povo livre que hoje, neles dois, visitei em pinotes e cambalhotas na minha alegria que nunca consegui conter! lá me falaram da sua gente! do seu sistema de saúde, da sua educação, da sua DEMOCRACIA, da sua vida. fomos, os cinco, íntimos amigos em confidências. das nossas alegrias, das nossas dificuldades. lá os espantámos com as limitações da nossa tão apregoada «democracia»! abriram em espanto as bocas incrédulas quando lhes relatámos dos nossos mais de dois milhões de pobres. dos nossos compatriotas, outros tantos, que estão privados de médico de familia. da elitização da nossa educação. da privatização do serviço nacional de saúde. da nossa carestia de vida e dos salários de fome. Lá nos contaram da sua revolução, do seu governo popular, do povo e ao serviço do povo, dos seus avanços sociais, políticos, culturais, mesmo perante o criminoso bloqueio capitalista! falámos do Ché - que o Rosell trazia na t-shirt com um orgulho arrepiante! - do Fidel, da américa latina, do futuro. Falámos dos nossos baptistas e salazares. contámos dos nossos resistentes, do nosso Partido e dos nossos heróicos clandestinos! comovemo-nos juntos, rimos despregando as bandeiras que alguns querem fazer como raia intransponivel. e o dia passou. marcámos outros encontros. traçámos projectos! partilhámos o sonho. e a certeza que, mais cedo que tarde, todos os povos do mundo - seguindo o exemplo do heróico povo cubano - também um dia tomarão os quarteis e as praças que houver que tomar! também nós, cumprindo ABRIL, espalharemos flores em cada rua onde habitar a memória de cada um dos homens livres que tiver tombado pela liberdade! esse dia chegará. sempre o soube, confirmei-o hoje. obrigado cecilia, rosell, alice e joaquina.
saímos de olhos vermelhos e uma alegria estonteante que embaciava os pararelos da estrada.
passos depois, antes mesmo de olhar sabia-os olhando-me. ergui o punho direito, voltei-me e sorrindo gritei ao mundo: E QUE VIVA CUBA!
VIVA CUBA, gritaram-me, aos mais intimos sentidos.

um dia alentejo, povo do meu país, a reforma agrária sairá portas fora. novamente! connosco, um povo inteiro do lado de lá do atlântico, repetirá o grito: E QUE VIVA PORTUGAL!

foi um dia tão bonito... e deu-me tanta força. mas tanta...

POEMA

(Visão de Mahler. Improviso durante
a audição na Rádio da Primeira Sinfonia.
Sim, Abelaira: gosto muito do Mahler
- que me soa às vezes como uma espécie
de Schubert trágico.)


Marcha fúnebre
com os vivos todos em caixões
e o cadáver atrás, a pé, sozinho,
ao som da filarmónica
que marca o passo a fingir vida
na poeira morta
do caminho...

Filarmónica transcendente
que afinal
só toca a valsa banal
da morte nua de toda a gente.


José Gomes Ferreira

COISAS DA ÉTICA...

Caso típico da prática dos políticos da política de direita é o de Moita Flores.
Nas últimas autárquicas, concorrendo como «independente» na lista do PSD, foi eleito Presidente da Câmara de Santarém.
Nas próximas autárquicas será candidato ao mesmo cargo, igualmente na lista do PSD, igualmente como «independente».
Entretanto virou-se publicamente contra Manuel Ferreira Leite, a pretexto das inclusões e exclusões por ela decididas nas listas do PSD para as legislativas - verberando a falta de «ética» que presidiu a essas decisões.
Em simultâneo - e exibindo o seu conceito de «ética» - declarou peremptoriamente que não vai votar no PSD - para as legislativas, é claro, porque para as autárquicas não apenas vota como apela ao voto no PSD.
(E com tudo isto, à líder do PSD faltou... a dignidade de correr com o tratante da lista do seu partido para a Câmara de Santarém.
Continuando a exibir a sua «ética», Moita Flores - candidato pelo PSD à Câmara de Santarém - fez questão de afirmar que, nas legislativas, «talvez vote no PS».
E a coroar tão feérica exibição de «ética», na próxima terça-feira Moita Flores fará entrega da «medalha de ouro da cidade de Santarém» ao primeiro-ministro José Sócrates - assim dando início... à campanha eleitoral do PS para as legislativas...

Não há dúvida: Moita Flores - por tudo o que disse e tudo o que vai fazer; e Manuela Ferreira Leite - pelo que não fez e deveria ter feito, pedem meças um ao outro em matéria de «ética»...

POEMA

(Uníssono de cordas arrebatadas duma Sinfonia -
russa, claro)


Ah! as bandeiras vermelhas desfraldadas
nos olhos das mães aos soluços.

Ah! a Revolução
com todos os filhos dos inimigos ressuscitados
nos romances russos.


José Gomes Ferreira

LIÇÃO DE ESTÒRIAS...

Há seis meses, foram divulgados, na Alemanha, os resultados de uma sondagem realizada na ex-República Democrática Alemã (RDA), na qual se pedia aos inquiridos que comparassem as suas vidas antes e depois da queda do Muro.
A resposta dada por 57% dos inquiridos foi a de que «a antiga RDA tinha mais aspectos positivos do que negativos», sendo que, desses, 8% consideram que «na RDA havia sobretudo aspectos positivos e vivíamos felizes e melhor do que na Alemanha reunificada de hoje» e 49% consideram que «na RDA havia alguns problemas, mas globalmente vivíamos melhor».

Perante isto, o governo alemão viu-se obrigado a vir a público desvalorizar os resultados da sondagem, explicando que eles decorriam do facto de o inquiridos estarem mal informados sobre o que era a RDA - explicação no mínimo estranha, se tivermos em conta que os inquiridos viveram na RDA e vivem, agora, na ex-RDA...
De qualquer forma - e porque vale mais prevenir do que remediar... - o governo alemão decidiu lançar uma «campanha de informação» sobre a «história da RDA» - campanha que tem vindo a ser levada à prática nas escolas, nas ruas, nos média, etc, etc.
E os sinais da «campanha de informação» cedo começaram a surgir: um grupo de «artistas plásticos» começou a ensinar «história da RDA» através de pinturas nas paredes, designadamente no que resta do Muro; os média começaram a leccionar a mesma história, etc, etc.

Não sei se integrando esta campanha se por iniciativa própria, o Público enviou à Alemanha uma jornalista - Alexandra Prado Coelho (APC) - com o objectivo de ver e, depois, ensinar aos leitores como é que era antes e como é que é 20 anos depois da queda do Muro, ou seja, com o objectivo de, tal como os seus colegas alemães, ensinar a «história da RDA».
APC esmerou-se e, em 6-reportagens-6, distribuídas por 18-páginas-18, proporcionou aos leitores do Público uma soberba lição de estórias.

Lendo as 18-páginas-18 - pecado que eu confesso ter cometido - a primeira conclusão a tirar é que APC, quando partiu da redacção do Público, já levava consigo as conclusões a que iria chegar, pelo que, chegada lá, foi só procurar, e encontrar, quem lhe confirmasse o que ela já sabia...

Para bom cumprimento da tarefa, APC começou por pegar pelos cornos, salvo seja, os resultados da tal sondagem. Para o efeito logo encontrou um estoriador que lhe disse que a opinião desses 57% «não faz zentido» - o que «faz sentido», isso sim, é a opinião contrária...
E ali mesmo ao lado, à mão de semear, estava outro estoriador, gémeo do primeiro, que alertou APC - e ela alerta os leitores do Público - para o gravíssimo risco que todos corremos de as opiniões desses 57% «se transformarem em rejeição da democracia»...
Depois, APC foi encontrando mais pessoas, tudo gente bem informada, tudo estoriadores especializados em «história da RDA», tudo gente escolhida a dedo - de tal forma que até parece que quando APC partiu da redacção do Público já tinha encontro marcado, em Berlim, com quem era necessário encontrar-se para o bom cumprimento da sua tarefa...

E registe-se o facto notável de, nestas andanças todas, neste contacto com pessoas e mais pessoas, Alexandra Prado Coelho não ter encontrado uma só pessoa do grupo daqueles 57% que têm uma opinião contrária à que ela já levava consigo quando partiu da redacção do Público...

POEMA

(«Sonata a Kreutzer» tocada por Menuhin,
no Tivoli.)


Que crime confessa Beethoven
nesta sonata?

Matou talvez em sonhos
a Sempre-Apetecida
com mãos de quem não mata.

E agora confessa o crime
- farto do amor eternamente sublime.

(Beethoven:
ai de quem não ama
como quem morre
- na cama.)


José Gomes Ferreira

VELHOS TRUQUES

Ainda a propósito dos recentes «dados» sobre a «economia» e o desemprego: disse Sócrates que as «melhorias na economia» se deviam à sábia política do seu Governo e que o aumento de desemprego era culpa da «crise internacional».
Ou seja: o que é bom fizemos nós, o que é mau veio de fora...

O truque é velho e tem sido utilizado por todos os primeiros ministros da política de direita - inimigos de Abril e homens de mão do grande capital - em especial por aqueles que levaram mais longe essa política e mais danos causaram a Portugal e aos portugueses: Soares, Cavaco, Guterres, Barroso e, agora, Sócrates.
A única diferença é que para Soares e Cavaco, por exemplo, as culpas eram da «conjuntura internacional» enquanto para Sócrates a culpada é a «crise internacional»...

Outro truque comum aos governantes PS/PSD ao longo dos últimos 33 anos, é o das promessas - promessas muitas, feitas em tempo da caça ao voto, e que depois, não apenas não são cumpridas como... antes pelo contrário...
Tomemos dois exemplos relacionados com o desemprego: Cavaco, no início do último mandato da longa década em que flagelou os trabalhadores, o povo e o País, prometeu a criação de 100 mil postos de trabalho - no final do mandato, o número de desempregados tinha aumentado em 100 mil...; mais perto da nossa memória estão os 150 mil empregos prometidos por Sócrates - tantos quantos os que, só no último ano, vieram aumentar o exército de desempregados...

É destes truques, velhos e sujos, que se alimentam os governantes da política de direita - homens de mão do grande capital e inimigos de Abril.

POEMA

ROMANCE DE FEDERICO

«El crimen fué en Granada: en su Granada!»

António Machado


I
Num pueblo de Espanha
la Barraca se levanta:
num pueblo de Espanha,
numa praça de Castela...

Mas não se ouvem poemas,
nem guitarras, nem canções
- que la Barraca é deserta...
Morreram vozes e risos
(no chão, com as folhas arrancadas,
D. Quijote de Cervantes)
e calaram-se as canções,
geladas no oiro frio
das cordas dos violões
-que la Barraca está deserta,
como uma alma... deserta.

Correi ventos de Espanha!
Chamai vozes de Espanha!
Mirad olhos de Espanha!
- Aonde está Federico?

Chorai corações de Espanha!

- No acampamento cigano
uma virgem desmaiou:
romance da «pena negra»
a feiticeira agoirou.
Romance da «pena negra»,
romance da negra sorte,
como uma bala na fronte
e outra no coração
morto para sempre ficou...
(No veludo dos estojos,
as cordas das guitarras estalaram
com um ai grave e profundo...)
as mãos estendidas, sem raiva,
os olhos cheios de terra,
morto ficou.

Chorai corações de Espanha!

Com os olhos cheios de terra,
sob o céu de su Granada,
morto ficou...

Cavalos negros da noite
encobriram as estrelas.
De Cádis até Navarra,
de Badajoz ao Levante.


II

A noite desceu sobre o corpo da Espanha...
A noite das águias carniceiras
desceu sobre o corpo da Espanha...

Ferem o chão fúrias soltas
- ruínas foram cidades e vilas,
escolas, lares e catedrais;
incêndios foram celeiros e searas;
ódio foi amor,
lágrimas foram riso...
A noite poisou seus dedos de treva
no coração da Espanha...

Espanha,
em teus braços de Mãe,
em teus braços de terra,
apodrecem os corpos
de teus filhos inocentes...
Espanha,
na sombra que desceu
as feridas dos cadáveres abrem-se
como flores roxas de agonia...

Espanha,
noites de serenata,
sob os balcões floridos, nunca mais:
que os corações não batem já para o amor,
só para o aço dos punhais...

Espanha,
Carmen, cigana,
corpo de bronze, olhos de lume,
não mais amante...
Espanha,
na noite das catedrais,
correm lágrimas de marfim
pelas faces dos crucificados
- na tua face
são de sangue, Espanha!
Espanha!,
no silêncio das catedrais
sorrisos seráficos da Virgem
- na tua boca
sangue e fel, Espanha!


Joaquim Namorado

SEGURANÇA - INSEGURANÇA

Eis uma frase típica dos presidentes dos EUA, ao longo dos tempos:

«Esta guerra será demorada e difícil. Mas a vitória é fundamental para a segurança norte-americana».

Quem a proferiu, desta vez, foi Barack Obama, referindo-se à ocupação do Afeganistão - mas poderia ter sido Truman, ou Eisenhower, ou Kennedy. ou Johnson, ou Nixon, ou Carter, ou qualquer dos Bush's, ou Clinton.
E tantas vezes ela foi proferida que bem podia passar a figurar como refrão do Hino Nacional dos EUA...

Como mostra a história, sempre que tal frase foi proferida, morreram milhares - por vezes centenas de milhares - de pessoas inocentes.
O que significa que «a segurança norte-americana» tem atrás de si um infindável rasto de morte, de terror, de crime, de sangue - já que «a segurança» do império é a insegurança do resto do mundo.

POEMA

UM DIA...


Um dia eu vou fazer um romance
com as histórias da minha rua
antes de se chamar Silva Porto
e os pretos irem embora.
Vai entrar a lua e meninos sem cor,
a Domingas quitata, o sô Floriano do talho,
com muita mistura de amor
e muito suor de trabalho.
Vou meter as cabras e os cães vadios da velha Espanhola,
os batuques da Cidrália e dos Invejados,
os batalhões do «Treze» e do «Setenta e Quatro»,
o bêbado Rebocho, o velho Salambió,
a Joana Maluca da garotada.
cajueiros, cubatas, lixeiras,
capim e piteiras,
e mesmo no fim da história,
quando os homens estão desesperados
e as fardas passam em fila,
acendo um sol de Fevereiro,
semeio algumas esperanças
e parto com o meu veleiro
a dar uma volta ao mundo!


António Cardoso

SAUDAÇÃO À RESISTÊNCIA

Persiste o silêncio dos média portugueses sobre a situação das Honduras: nem notícias, nem artigos de opinião, nada.
E são cada vez mais e mais óbvias as razões que estão na origem desse silêncio.

Hugo Chávez revelou, no domingo, que o golpe militar das Honduras foi organizado a partir da base de Palmerola - a base militar dos EUA nas Honduras - e que a ordem de enviar o Presidente Manuel Zelaya para a Costa Rica proveio de militares norte-americanos dessa base.

Chávez respondeu, também, às declarações hipócritas do Presidente dos EUA:
«Obama, não te pedimos para intervir nas Honduras. Pelo contrário, pedimos-te é que o império tire as mãos das Honduras e as garras da América Latina».

Por tudo isto, o cerco imperialista aos países da América Latina que se libertaram do seu domínio, vai-se adensando e assumindo expressões cada vez mais inquietantes: o secretário-greal do Partido Comunista da Venezuela, Óscar Figuera, denunciou a entrada na Venezuela de 150 mercenários colombianos e alertou para o facto de, no sábado passado, três helicópteros colombianos terem sido detectados na zona fronteiriça, tendo um deles violado o espaço venezuelano durante dez minutos.

Apesar disso, nas Honduras a resistência ao golpe cumpriu hoje o seu 52º dia e fê-lo com uma manifestação em Tegucigalpa - uma manifestação a partir de concentrações organizadas nos bairros da capital até à Universidade Pedagógica Nacional.
Para amanhã está prevista uma caravana automóvel - com «tudo o que roda e faz barulho» - também na capital, onde domingo terá lugar um concerto.

E é essa resistência heróica do povo hondurenho que o Cravo de Abril saúda e à qual manifesta a sua total solidariedade.

POEMA

ESPERA


Nesta longa e fluctígera espera
se transmudam os dias
de desespero, luta e coerência.
Mas é tão certo a flor
do sonho florir na terra amada,
que já bebo alegrias antecipadas
- exausto de silêncio e de calor!


António Cardoso

VAI UMA APOSTA?

O Sol, na sexta-feira, e o Expresso, no sábado, levaram à prática uma forma curiosa de anunciar o Programa Eleitoral do PCP - Programa de Ruptura, Patriótico e de Esquerda.
O primeiro, produziu uma peça intitulada «O que separa PCP e BE», na qual faz a comparação entre os dois programas.
O segundo, produziu uma peça intitulada «Descubra as diferenças entre PCP e BE», na qual faz a comparação entre os dois programas.
Ou seja: até a apresentação do Programa do PCP serve a estes dois jornais para fazer propaganda ao BE...

Entretanto, vários jornais anunciaram o local e a data do arranque (mais um...) da campanha eleitoral do PS: Coliseu dos Recreios de Lisboa, dia 6 de Setembro.
Quer isto dizer que a coisa ocorrerá no dia em que, na Festa do Avante, se realizará o grande comício de encerramento, com Jerónimo de Sousa.
É uma coincidência, obviamente.
No entanto, pela propaganda feita ao anúncio da ocorrência, estou convencido que a ocorrência propriamente dita será a grande notícia desse dia 6.
Ou seja: no dia 6 de Setembro, os média dominantes - jornais, rádios e televisões - vão dedicar a parte maior do seu tempo e do seu espaço à iniciativa do PS, relegando o comício da Festa para a categoria das coisas secundárias...
Vai uma aposta?

POEMA

COMBOIO DE MALANGE


Prisioneiro no meu escritório
sonho as distâncias do mato
que me traz o apito do comboio
que arfa
Grande
e Livre
quando passa.

MINHA TERRA, MINHA TERRA, MINHA TERRA
VENHO-DE-LONGE, VOU-PRA-LONGE,
VENHO-DE LONGE, VOU-PRA-LONGE.

Ainda um dia vou partir
nesse comboio do mato
que tem dor no vagão J
e vou ser como ele
que arfa
Grande
e Livre
quando passa.

Depois
todo povo vai dizer:
MINHA TERRA, MINHA TERRA, MINHA TERRA!


António Cardoso

HONDURAS - SOLIDARIEDADE

Num quadro em que a repressão dos golpistas e a mentira dos que os sustentam se intensificam, a resistência do povo das Honduras continua - todos os dias e por todo o país, na capital e no interior.
Grandes manifestações em Tegucigalpa, em San Pedro Sula e em várias outras cidades marcaram o dia de sexta-feira. Na cidade de Choloma, a 250 quilómetros da capital, as forças repressivas carregaram sobre os manifestantes e fizeram muitos feridos.

Entretanto, os média locais, em estreita ligação com os seus gémeos da América Latina e dos EUA, prosseguem a campanha de silenciamento sobre a situação real vivida nas Honduras e, simultanemente, de deturpação, manipulação e mentira sobre o que ali, e em toda a América Latina, se passa - uma campanha fielmente seguida pelos média dominantes no resto do mundo, aí incluídos os média portugueses propriedade do grande capital.

Trata-se de uma operação mediática típica dos «cães de guarda» do imperialismo norte-americano e que, ao seu serviço, tem como objectivo, no que respeita às Honduras, «legalizar» e perpetuar o golpe fascista e, em relação à região, dar novos passos em frente na ofensiva do governo de Obama contra os países e povos que têm vindo a libertar-se do domínio dos EUA.
É nesse sentido que se desenvolve a campanha de mentiras sobre a Venezuela, com a proliferação de notícias que apresentam o Presidente Hugo Chávez como um «ditador» que «encerra rádios, jornais e televisões», que é «apoiante das FARC» - e que, por isso, e em nome da democracia, tem que ser definitivamente varrido... - ao mesmo tempo que sobre os presidentes Daniel Ortega, Evo Morales e Rafael Correia são inventadas iguais patranhas.
Nos últimos dias, a Venezuela tem tido presença constante nos média dominantes no mundo, todos dizendo o mesmo, todos procurando fabricar verdades através da repetição exaustiva da mentira - método que utilizam igualmente para a glorificação do governo do narco-fascista Uribe como modelo de governo democrático...
Tudo bem ao estilo do vale-tudo que sempre caracterizou a acção criminosa dos EUA na região, ao longo dos tempos.

A cada dia que passa, parece ser mais evidente que o golpe militar das Honduras, juntamente com a instalação das novas bases dos EUA na Colômbia, constituem peças fundamentais da ofensiva com a qual a administração Obama pretende liquidar os processos de mudança, libertadores e emancipadores, em curso em diversos países da América Latina.

Daí a importância acrescida da solidariedade com o povo das Honduras na sua luta corajosa contra os golpistas e pela reposição da legalidade democrática.

POEMA

É INÚTIL CHORAR


É inútil mesmo chorar
«Se choramos aceitamos, é preciso não aceitar»
por todos os que tombam pela verdade
ou que julgam tombar.
O importante neles é já sentir a vontade
de lutar por ela.
Por isso é inútil chorar.

Ao menos se as lágrimas
dessem pão,
já não haveria fome.
Ao menos se o desespero vazio
das nossas vidas
desse campos de trigo...

Mas o que importa é não chorar.
«Se choramos aceitamos, é preciso não aceitar»
Mesmo quando já não se sinta calor
é bom pensar que há fogueiras
e que a dor também ilumina.

Que cada um de nós
lance a lenha que tiver,
mas que não chore
embora tenha frio.
«Se choramos aceitamos, é preciso não aceitar»


António Cardoso

SIMPLESMENTE UM TELEFONEMA

Obama chamou «hipócritas» aos que exigem ao governo dos EUA a condenação inequívoca do golpe de Estado das Honduras e a reposição da legalidade democrática naquele país.
«Hipócritas» porque, diz ele, os que, agora, lhe exigem uma intervenção nas Honduras são os mesmos que condenaram todas as intervenções militares dos EUA noutros países...

Não creio que os que fazem essas exigências ao presidente norte-americano, estejam a pensar numa típica intervenção militar dos EUA, com as tropas especiais a entrarem por ali fora, arrasando, destruindo, matando - e, especialmente, ocupando.
No que me diz respeito, não só não defendo como abomino tal coisa - e a intervenção que exijo a Obama é outra e bem diferente.

Obama não é visitante do Cravo de Abril e, portanto, nunca terá conhecimento da minha opinião sobre este assunto...
Mesmo assim, aqui fica, em quatro pontos, o que penso sobre o que deveria ser a sua intervenção nas Honduras.
É fácil, não tem nada que errar:

1 - sente-se na sua secretária da Casa Branca;
2 - pegue no telefone e ligue para Micheletti;
3 - ordene-lhe que devolva imediatamente o poder ao Presidente legítimo das Honduras, Manuel Zelaya;
4 - aguarde uns minutos - e constatará que Micheletti obedecerá com a mesma prontidão com que obedeceu à ordem de executar o golpe militar de 28 de Junho.

Como se vê, a intervenção que exijo ao Presidente Obama é simples, não lhe rouba mais do que uns minutos e não implica mais do que o custo de uma chamada telefónica...

POEMA

FÉNIX


Não seriam palavras o meu canto
nem seria assim quieta a minha morte,
se à viva sorte, um mar de desencanto,
não me tivesse adiado certo norte...

E no acto de viver, se a vida canto,
pura, a este coração lúcido e forte
o devo, mas com temor e já quebranto
na carne agora mais perto da morte;

Entre grades não corre qualquer rio,
nem pode a vida florescer sem luto,
se no exílio até o sol é um astro frio...

Mas das cinzas renasço resoluto,
(Meu canto é já sereno desafio):
Se o presente dói, pelo futuro, luto!...


António Cardoso

CONSELHO DE AMIGO

Leonardo Bernstein - que, além de um grande compositor, foi chefe da Orquestra Filarmónica de Nova Iorque - foi objecto de cerrada vigilância por parte do FBI durante vários anos, por supostas actividades comunistas.
O volumoso dossier (800 páginas) elaborado pela polícia dá nota de que as escutas e a vigilância a Bernstein começaram nos anos 40 (era de Truman) e prologaram-se pelo menos até à presidência de Nixon - tendo atingido maior intensidade no tempo da demencial «caça aos comunistas» dirigida pelo sinistro McCarthy.

Em 1953, o departamento de Estado recusou renovar o passaporte de Bernstein, apesar de este ter assinado uma declaração em que negava pertencer, ou ter pertencido, ao Partido Comunista dos EUA.
Mas tal declaração não convenceu os seus vigilantes: o então director do FBI - o famosíssimo (por múltiplas razões...) J. Edgar Hoover, «sabia» que Bernstein estava «ligado, filiado ou de alguma maneira associado a várias associações comunistas» - a besta não fazia a coisa por menos...
Esse «saber» de Hoover advinha-lhe, certamente, das informações que lhe chegavam através da vasta rede de bufos ao seu serviço - bufos que, por vezes, baseavam as suas informações em «factos» como este: «Sei que Bernstein é membro do PC. Não tenho provas, mas sei pela maneira como ele fala» - e quem podia duvidar de um «saber» assim adquirido?

Assim funcionavam as coisas, no tempo da guerra-fria, no «país da liberdade, da democracia e dos direitos humanos» - a fazer-nos lembrar o que por cá se passava na mesma altura.

E hoje, como funcionam as coisas lá e cá?...

Seja como for, amigos visitantes do Cravo de Abril, aconselho-vos a terem muito cuidado com a maneira como falam...

POEMA

AMIZADE


Passam anos - passa a dor;
passa a dor - passam enganos...
Só nunca passa o calor
dos amigos que ganhamos...


António Cardoso

FASCISMO NUNCA MAIS

O poder dominante não gosta de ouvir gritar «25 de Abril Sempre» - porque odeia ABRIL.
Nem gosta de ouvir dizer e ver que «A Luta Continua» - precisamente porque sabe que na luta, tenha ela que objectivos imediatos tiver, ABRIL é sempre uma referência maior.
Muito menos gosta que lhe digam que «Fascismo Nunca Mais» - porque quem odeia ABRIL não pode antipatizar por aí além com o fascismo que ABRIL venceu...

Por isso, ABRIL - as suas conquistas históricas, os seus ideais de liberdade e de justiça social - tem sido o alvo principal dos ataques da política de direita levada a cabo por sucessivos governos PS e PSD ao longo dos últimos 33 anos - durante os quais se têm sucedido os casos de perseguições, chantagens, repressão sobre os que não desistem, nem desistirão, de lutar por ABRIL.

Agora foi a vez de quatro jovens do núcleo da Amadora da União dos Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP) que, naquela localidade - na Avenida Salvador Allende... - procederam à pintura de um mural com o símbolo da URAP e a inscrição «LUTA E RESISTE - FASCISMO NUNCA MAIS».
A polícia foi lá proibir, identificando e ameaçando prender os quatro jovens - os quais, concretizando o que tinham acabado de escrever, lutaram e resistiram.

E o mural lá está.
A confirmar que ABRIL RESISTE.
E a incitar-nos a lutar para que FASCISMO NUNCA MAIS.

POEMA

RATICIDA


Os ratos são covardes.
Os ratos mordem, pela calada,
correm,
saltam,
fogem,
mijam
- Têm medo da Madrugada.

Os ratos têm ratas
que não parem
- «Dão à luz»
Mas vivem na escuridão...

E também têm filhos,
coitados dos filhos!
- Têm de ser ratos à força.

Há ratos felpudos, carnudos,
de conselhos de administração...
Há ratos amarelos, pés-de-lã,
de corredores de prisões...

Há ratos sanguíneos, róseos, taurinos,
linfáticos, atebrínicos, fleumáticos,
e de todos os tamanhos, feitios e cores...

Os ratos são finos:
quando a água entra,
até fogem dos vapores...

Os ratos são muitos!
Os ratos são demais!
Mas não tantos, assim,
que a Madrugada não rompa!!!


António Cardoso

A FERRO E FOGO

José Manuel Fernandes (JMF), director do Público, desnudou-se, hoje, uma vez mais, em editorial - e o que exibe é o habitual mete-nojo de provocar vómitos.
A pretexto das Honduras - finalmente!... - debita um texto abjecto sobre a América Latina. Trata-se de uma daquelas prosas típicas dos propagandistas assumidos do imperialismo norte-americano e no qual JMF se confirma como falcão sedento de crime e de sangue.
O que não espanta, tratando-se de quem se trata, mas que não pode passar sem registo... para que fique registado...

Como é habitual neste tipo de práticas, o Director do Público socorre-se de igual trabalho sujo de dois colegas - um «prestigiado intelectual mexicano» e uma «especialista em assuntos sul-americanos» - e conclui, com eles, tudo o que, de facto, ao imperialismo norte-americano interessa que os seus propagandistas concluam e divulguem.
Diz JMF, de braço dado com o «prestigiado intelectual mexicano», que em relação às Honduras, é preciso «separar as águas e regressar, de forma coerente, aos princípios democráticos» - vejam bem!...
Ou seja: «não se deve condenar o golpe como se este tivesse ocorrido "num vazio", mas ter em consideração que ocorreu para impedir um outro "golpe constitucional",
ou seja: «os "golpistas" actuaram ilegalmente, só que o fizeram para repor a legalidade».
Ou seja: viva o golpe fascista, viva a repressão fascista, viva o encerramento de órgãos de informação, viva o governo golpista, vivam o crime, os presos e os assassinados: viva a morte!

Diz ainda JMF que os presidentes dos EUA, do Canadá e do México, presentes na actual Cimeira dos líderes da América do Norte, não podem deixar-se ir «a reboque de Chávez e dos seus aliados mais ou menos autoritários, como Daniel Ortega (Nicarágua), Rafael Correia (Equador) ou Evo Morales (Bolívia), alguns deles no poder graças ao apoio dos petrodólraes venezuelanos» - e não diz mas sente e pressente que o melhor é mandar lá uns marines e umas tropas especiais para, à boa maneira dos EUA, repôr a legalidade democrática, a liberdade e os direitos humanos...
Tanto mais que, informa JMF, a colega «especialista em assuntos sul-americanos» revelou «novos documentos sobre a ligação entre os apoiantes de Manuel Zelaya e as FARC» - os tais «documentos» que a CIA fabrica e manda revelar através das suas agências e agentes espalhadas pelo mundo, género Público e JMF - e que estão fartos de revelar idênticas ligações às FARC por parte da Nicarágua, do Equador e da Bolívia...

E era essa a grande questão a que JMF queria chegar: a guerra santa que tem como protagonistas, de um lado, Uribe que JMF vê como «o presidente determinado (que) combate o terrorismo guerrilheiro e o narcotráfico», e do outro lado, as FARC e todos os que não apoiam o narco-fascista...
Isto é: de um lado os sacrossantos interesses do imperialismo norte-americano; do outro lado os povos que assumem o direito humano de decidirem sobre os seus destinos - e que é necessário arrasar, liquidar, eliminar de uma vez por todas. A ferro e fogo.

POEMA

INVENCIBILIDADE


Os braços desfaleçam, jorre o sangue, o último grito
fira, agónico, o silêncio da noite petrificada...
Ainda no corpo morto ficará, como granito,
imperecível certeza da mais rubra madrugada!...


António Cardoso

MAS HÃO-DE VOLTAR

Hillary Clinton está em Angola e encontrar-se-á hoje com o Presidente José Eduardo dos Santos.
Ontem, numa conferência de imprensa realizada em Luanda, a secretária de Estado norte-americana disse, a dada altura:
«Esperamos com impaciência que Angola aproveite esta etapa positiva para adoptar uma nova Constituição, para investigar e levar a tribunal as pessoas culpadas, no passado, por violações aos direitos humanos e para organizar a tempo uma eleição presidencial livre e justa».

Trata-se de uma ordem bem ao estilo do imperialismo norte-americano de sempre, desde o Truman ao Obama, passando pelo Reagan, pelos bush's, pelo Clinton e pelos outros todos.
Uma ordem que é para cumprir já, porque a senhora está impaciente.
Uma ordem dada ao presidente de um país soberano, na capital desse país e antes de se encontrar com esse presidente - ou seja: informando o presidente, através dos média, sobre o que lhe irá ordenar no encontro oficial.
Uma ordem dada no tom insolente e arrogante dos grandes patrões quando, impacientes, falam aos criados.

Do ponto de vista diplomático, estamos perante um verdadeiro escândalo.
Do ponto de vista político, estamos perante uma ofensa, um insulto, uma provocação miserável..
Do ponto de vista político-diplomático estamos perante um caso para o qual a única solução digna seria: acompanhar a senhora ao avião, despachá-la para o país de origem - e, por delicadeza, desejar-lhe boa viagem.
Claro que não foi isso que se passou: o mais provável é que, neste preciso momento, o presidente ofendido e a ministra que o ofendeu, estejam, sorridentes, a posar para os média - os mesmos média que, ontem, divulgaram as ordens da patroa...

Estão longe - muito, muito longe... - os tempos do MPLA e do Presidente AGOSTINHO NETO: os tempos da verticalidade e da coragem patriótica: os tempos da DIGNIDADE.
Estão longe... mas hão-de voltar.

POEMA

FUGA DA CELA DISCIPLINAR


Está uma noite
com lua, tão lua,
que quase endoidece.

Que até apetece
desertar da cela,
cair numa rua,
prender uma bela,
deitá-la no chão
tão nua, tão nua,
em beijos tão longos,
tão longos, tão longos,
que quase endoidece.


António Cardoso

HONDURAS VENCERÁ!

O Cravo de Abril insiste na divulgação de notícias sobre a situação nas Honduras.
Não tendo a pretensão de furar o cerrado cerco mediático montado pelos pasquins do grande capital - que, ao serviço dos golpistas e do governo de Obama que os apoia, silenciam tudo o que ali se passa - continuaremos a partilhar com os nossos visitantes as notícias a que formos tendo acesso.
É esta a forma de o Cravo de Abril expressar a sua total solidariedade com a resistência do povo hondurenho.

A partir das aldeias e comunidades do interior das Honduras, prossegue e aumenta o seu caudal a Marcha Nacional de Resistência Popular. A Marcha segue em duas direcções: Tegucigalpa e San Pedro Sula, a segunda maior cidade do país.
Prosseguem, igualmente, as greves e paralisações de trabalho e várias outras formas de luta contra o governo fascista apoiado, de facto, pelos EUA.

Entretanto, a repressão acentua-se: segundo o Comité dos Familiares dos Detidos e Desaparecidos, sucedem-se as prisões, cresce a violência e aumenta o número de «desaparecidos» - o recolher obrigatório é imposto pelos golpistas em várias regiões.

Em Tegucigalpa, milhares de pessoas revezam-se numa vigília contínua frente aos edifícios da embaixada da Venezuela e da Rádio Globo Honduras, com o objectivo de defender estes dois edifícios das forças policiais.
Como é sabido, a Rádio Globo Honduras é a principal fonte de informação sobre o que se passa no país e tem sido alvo de ameaças e represálias. Quanto aos diplomatas venezuelanos, eles rejeitaram corajosamente a ordem de expulsão de que foram alvo, alegando que a Venezuela não reconhece o governo golpista.

Numa entrevista colectiva, realizada na via pública, na capital, perante milhares de pessoas, dirigentes da Fente Nacional Contra o Golpe denunciaram a «duplicidade» do Governo dos EUA:
«por um lado diz que reconhece Manuel Zelaya como presidente (embora recusando-se a qualificar os acontecimentos de 28 de Junho como um golpe de Estado), por outro lado desenvolve uma estratégia para que a situação actual se prolongue e os golpistas se consolidem» - e concluiram incisivos:

«Só a resistência do povo conseguirá derrotar os golpistas. O que nós não fizermos, ninguém o fará por nós».


A LUTA CONTINUA!
HONDURAS VENCERÁ!

POEMA

PONHO A MÃO SOBRE ESPANHA


Ponho a mão sobre Espanha e juro
que nunca escreverei seu nome em vão.
Se me sabeis alguma vez perjuro
de Espanha e do seu povo,
decepai-me esta mão.


Jesus Lopez Pacheco

AVANTE !



O Manel tem três dentes hiantes na memória da fome que carrega: e quarenta anos de militante do nosso Partido, no orgulho vertical que carrega todos os dias. hoje, como muitas vezes, almocei na sua companhia. na sede do meu Partido, as pataniscas com arroz de tomate, foram pretexto para a mais bela conversa de que me lembro. o Manel tem 84 anos e uma vida feita de misérias, e nelas de alegria. mineiro, e comunista, muitas vezes sofreu na pele a repressão do fascismo que lhe roubava o pão e a saúde num trabalho penoso que nem as bestas... o Manel é meu amigo. tem a quarta classe feita em adulto e o gosto singelo das palavras que aprendeu pela paixão que nutre pelo saber, que a dureza da vida lhe quis proibir mas que nunca permitiu. aprendeu com os Avantes! as palavras que lhe faltavam para dizer dos seus dias. e hoje, quem entrar no centro de trabalho do Partido, encontra-o ao fundo, escrevendo em cadernos mensagens bonitas às pessoas de quem gosta. o Manel tem o coração a transbordar de vermelho. gosta da Liberdade e da Camaradagem. todo ele é feito das lutas que travou e da amizade que tem a todos os camaradas, mesmo que os não conheça. o Manel, oitenta e quatro anos vencidos ao fascismo e ao capitalismo, como muitos da sua idade, tem uma reforma de vergonha, muitos anos após árduo trabalho. talvez por isso, me encha de prazer pagar-lhe uma refeição e um café. os olhos pequeninos de que já pouco se serve (é cego de um olho e de outro apenas vê 60 por cento, na organização que a medicina sempre necessita para informar o Estado da deficiência) brilham sempre que da minha boca se solta uma palavra que considere bonita e, na sua extrema humildade, se considere indigno. o Manel, desde a morte do meu tio, com 90 anos, é o amigo mais velho que tenho. hoje descobri que nunca foi à festa do Avante! não que se tivesse queixado ou soltado lamento. Mas soube-o. e enfrentei-o com a dura pergunta: Manel, nunca foste ao Avante? os olhos do meu amigo entristeceram... neles vi o reflexo da magra reforma e a perna manca que o impossibilita de caminhadas maiores que alguns metros, antes de ter de parar para a descansar. nunca fui, disse-me. mas tenho pena. vou morrer antes de conhecer a mais bonita festa do mundo. Justificou dizendo que sabe muito de bailaricos, e que não falha um em Aljustrel.
chorei. embora disfarçando, correram lágrimas dos meus olhos. mas disse-lhe: este ano vais comigo! olhou-me como nunca ninguém até então. camarada, disse-me, não posso ir contigo. estou velho e as pernas obrigam-me ao descanso.
vais sentado no carro ate la. paramos para um café a meio caminho. comprar-te-ei uma cadeirinha e lá, sempre que precisares, de cinquenta em cinquenta metros, no domingo, pararemos para conhecer camaradas do país todo, para que possas descansar. os seus olhos humedeceram... marcámos encontro para domingo de manhã, mesmo que muitas vezes almocemos juntos até então. este ano, desculpem os camaradas da rotina de três dias seguidos, domingo regressarei a Aljustrel logo pela madrugada. o Manel espera-me e eu leva-lo-ei até à mais bela festa de todas. almoçaremos onde o cansaço das pernas mancas o exigir. às três, lá estaremos em frente ao palco 25 de Abril, para reforçarmos a LIBERDADE. passearemos no recinto espalhando a alegria de estar vivos e de sonharmos. numa qualquer tasquinha beberemos a amizade num brinde em que lembramos o sonho comunista. depois de jantar viremos embora. assim será até a morte levar um de nós... todos os anos. o Manel, resistente anti-fascista e militante comunista, não falhará mais nenhuma festa. a FESTA MAIS BONITA DO MUNDO!, nas suas ternas e sábias palavras. enquanto um de nós for vivo, os domingos da festa serão vividos entre a multidão, pelos dois, como verdadeiros camaradas. ele disse-me que não quer dar trabalho! eu disse-lhe que nunca lhe poderei agradecer a LIBERDADE, por mais que faça. gosto do Manel. ele gosta de mim! somos camaradas! temos festa! temos PARTIDO.

Nunca mais é domingo de AVANTE?

POEMA

OS MENINOS NASCEM


Vós podeis, tiranos, forjar ainda mais sólidas algemas,
chapear de aço as paredes das nossas e vossas cadeias,
e fazê-lo-eis;

Vós podeis, tiranos, cravar mais fundo as vossas baionetas,
esmagar-nos nas ruas debaixo das patas dos vossos cavalos,
e fazê-lo-eis;

Vós podeis, tiranos, roubar, incendiar, fuzilar sem descanso,
vedar os caminhos ainda livres, envenenar as fontes ainda puras,
e fazê-lo-eis;

Vós podeis, tiranos, vir de novo descarregar a vossa cólera
sobre Oradour,
lançar vossa chuva de raios sobre o nosso humano desejo de viver,
e fazê-lo-eis;

Vós podeis, tiranos, inventar ainda piores piores suplícios,
mordaças mais espessas, baixezas mil vezes mais desumanas
para Buchenvald,

inutilmente o fareis:

Esta simples criancinha dormindo em seu berço,
este menino ainda na barriga de sua mãe, olhai
como vos fitam
serenos e terríveis.


Papiniano Carlos

HONDURAS RESISTE

A resistência do povo das Honduras continua.
Todos os dias e em alguns dias com participação redobrada.
Foi o que aconteceu na passada quarta-feira, em que centenas de milhares de hondurenhos ocuparam as ruas das principais cidades do país, exigindo o regresso do Presidente Manuel Zelaya.

Em todo o lado, as manifestações foram brutalmente reprimidas.
Na capital, Tegucigalpa, a polícia invadiu a Universidade Nacional Autónoma das Honduras (UNAH) e carregou violentamente sobre os três mil estudantes que ali se manifestavam, agredindo igualmente jornalistas e a própria reitora da Universidade.

Sublinhe-se o facto, bem elucidativo do carácter repressivo da ditadura instalada no país, de esta ser a primeira vez que a UNAH é invadida por forças policiais - não o tendo sido mesmo no tempo da cruel ditadura de Álvarez Martinez que, nos anos 80, às ordens da CIA, não apenas instalou o terror no país, como transformou as Honduras numa base de formação de terroristas, designadamente os 15 mil Contra que dali partiram para a Nicarágua com o objectivo de derrubar o governo revolucionário da Frente Sandinista.

Entretanto, registaram-se mais dois assassinatos: Roger Vallejo, professor, morto com um tiro na cabeça no decorrer de uma manifestação e outro professor, este dirigente sindical, assassinado com 25 punhaladas quando regressava a casa, depois de ter assistido ao velório de Vallejo.

Os média portugueses, fiéis a si próprios e aos seus selectivos critérios de desinformação organizada - e fechando nas gavetas de directores e chefes de redacção a liberdade de informação conquistada com o 25 de Abril - continuam a silenciar o que se passa nas Honduras, seguindo à risca as orientações do governo dos EUA.
Assim, nenhum jornal de ontem fez a mínima referência às manifestações de quarta-feira passada - e sobre elas o Diário de Notícias de hoje fornece uma «informação» que faz lembrar as «informações» do tempo do fascismo. Diz o jornal, em menos de meia dúzia de linhas, que «continuam as manifestações a favor e contra o líder deposto» e que «estudantes apoiantes de Zelaya atiraram pedras e paus contra a polícia, tendo os agentes respondido com gás lacrimogéneo»...

Já no que toca às posições dos EUA sobre as Honduras, os média portugueses não deixam os seus créditos por mãos alheias.
O Público de ontem e o Diário de Notícias de hoje realçam e louvam a «imparcialidade dos EUA na crise política das Honduras»...
E que «imparcialidade» é essa?
O Governo de Obama explica:
«A política norte-americana nas Honduras não é de apoio a ninguém em particular»;
e, por isso, continua a explicar o Governo Obama, «Os EUA recusam considerar a hipótese de avançar com sanções económicas»;
além disso, o Governo Obama classifica de «acções provocatórias», as tentativas de Zelaya de regressar às Honduras...

Mais palavras para quê?: é o Governo Obama a confirmar o seu papel de direcção no golpe fascista das Honduras; e são os média portugueses, à semelhança dos seus gémeos internacionais, a confirmar o seu apoio a esse golpe fascista.

Apesar disso, HONDURAS RESISTE! - e, resistindo, VENCERÁ!